sexta-feira, 25 de fevereiro de 2011

COMO NÃO ASSEGURAR DOAÇÕES DE LIVROS AS BIBLIOTECAS PÚBLICAS DO ES SEM CONSTRANGIMENTO

bookshelf

 

Inocente como criança procurei informações na Biblioteca pública da FAFI a respeito de possível doação de livros. A pessoa que me atendeu não era responsável pela Biblioteca, mas me assegurou que não estavam recendo doações. Fiquei sem resposta.

Coincidiu que a resposta encontrei no mesmo dia ao ler o texto de Rita de Cássia Maia (Diretora da Biblioteca Pública do Espírito Santo) com o título “DOAÇÃO DE LIVROS”, publicado no jornal A Gazeta. Achei o texto sugestivo, então simulei uma possível conversa, com uma possível responsável por uma possível Biblioteca, caso esses possíveis personagens pensassem a doação de livros como sendo constrangedor. As falas aspeadas foram copiadas na íntegra do texto de Rita de Cássia Maia.

- Boa tarde senhora! Gostaria de obter algumas informações sobre como proceder para doar livros à Biblioteca. – Perguntei à bibliotecária.

- Um momento senhor.

Silêncio absoluto!

- Pode me acompanhar senhor? Por Aqui. Está vendo aquela porta adiante? – Respondi que sim.

- O senhor procure melhores informações lá. Boa tarde!

Toc, Toc,Toc, bati à porta e esperei retorno. Toc, toc, toc, a porta era estreita sugerindo que guardava um espaço também pequeno. Pensei se devia continuar batendo à porta ou retornar à biblioteca.

Retornei!

- Licença, senhora bibliotecária!

- Ah! É o senhor novamente!

- Bati por duas vezes e ninguém atendeu à porta.

- Qual porta o senhor bateu?

- Aquela que a senhora me indicou.

- Mostre-me, por favor!

Indiquei a porta com o dedo. – Aquela lá.

- Não senhor! Eu disse que era aquela outra mais à frente.

- Ah! Que descuido o meu. Peço desculpas!

Segui na direção indicada e diante da nova porta bati:

- Toc,toc,toc.

-Pois não, senhor! Atendeu-me uma senhora muito simpática.

- Gostaria de informações sobre o procedimento para doação de livros à biblioteca e a bibliotecária me encaminhou até esta porta.

- Ah, sim! Vamos, entre! Sente-se um pouco.

Sentei-me e a senhora abriu um arquivo de aço e começou a mexer alguns documentos. Retirou uma pasta e de dentro duas folhas de papel com perguntas para serem respondidas por mim, e as me entregou:

- O senhor preencha essas folhas, por favor!

Antes de preenchê-las passei uma rápida olhada e percebi muita informação pessoal do tipo: é doador de sangue e medula óssea? Sim ou não. Mora de aluguel ou possui casa ou apartamento? Se possui informe se é financiada(o) e por quem. Prefere a música clássica ou é adepto do Rock? E continuava com um batalhão de perguntas, uma puxando outra, que cheguei achar duas folhas economia de papel. Claro que isso é muito bom!

- É para preencher agora ou trazer depois? Estava sem ânimo para essa tarefa.

- Fica ao seu critério, mas precisamos do seu cadastro.

- Posso fazer algumas perguntas sem ter o questionário preenchido?

- Se o senhor não ocupar muito meu tempo... É que tenho horário marcado, o senhor sabe... Funcionário público não tem sossego; somos o cimento com o qual a sociedade se estrutura organizada e limpa.

- Claro! Disse com uma forte disposição em fazer concurso público. Aquela idéia de cimento e limpeza me tomou de assalto a tal ponto de me contaminar com a nobreza do funcionalismo público. Porém um estado de espírito enriquecido é fagulha para pouca pólvora. Levantei-me como a querer fazer uma grande declaração:

- Eu tenho alguns livros; romances, na maioria, que gostaria de doar à biblioteca pública. Já vi que vários títulos que possuo vocês não têm e, bom... É claro que não são livros novos na acepção corrente da palavra, mas se o manusear verá que são livros em perfeito estado de conservação.

A senhora jogou um balde de água gelada em minhas pretensões discurseiras:

- Não vou tomar muito o seu tempo, senhor! Serei rápida. Não estamos recebendo doações, e mesmo que estivéssemos há um procedimento técnico-científico muito criterioso. “Trata-se de levar em conta os objetivos da instituição, a preservação da qualidade de seus acervos e seu crescimento equilibrado em quantidade e qualidade.”

- Qual o objetivo..., Desculpe a interrupção senhora, mas qual o objetivo de uma biblioteca? Biblioteca é biblioteca, quero dizer...

Estava um pouco nervoso e não conseguia articular direito as palavras. Queria perguntar o que era crescimento equilibrado em uma biblioteca; será que ela estava dizendo que para cada romance eu deveria doar um tratado científico, um auto-ajuda...

Se eu doasse apenas romance obviamente o acervo “romance” cresceria em detrimento de outros títulos e aí poderia desequilibrar a qualidade no atendimento ao público. A biblioteca poderia ficar com má fama, já que os filósofos, teólogos, cientistas, matemáticos, estariam quantitativamente em menor número que os românticos: Machado, Dickens, Gabriel, Alencar, Alan Poe... Meu Deu! Como eu era ridículo e pequeno diante da grandeza daquela senhora que me expunha de forma tão nobre sua preocupação com a biblioteca enquanto eu, como uma larva, a destruía de forma tão insignificante e deprimente desejoso de doar alguns romances.

Ela olhou-me com desconfiança e continuou:

- Como deveria saber “todo material deve passar por uma análise prévia. A BPES só aceita uma determinada doação se tiver autonomia para selecionar o que lhe convém.

- É justo que seja assim, embora presuma que quem está disposto a doar livros a uma biblioteca pública não o fará com livros sem folhas. Não se trata de mera valorização do leitor, mas quem lê, presume-se, tem educação suficiente para lidar com os livros de forma diferente do uso comum (sabemos que o número de leitores no Brasil é muito pequeno, é um grupo seleto, consistente e consciente).

- Agora quanto ao que significa, nesse caso, a palavra “convém”... Parece-me que estamos falando de biblioteca pública, que contém livros de um lado e leitores ávidos por livros de outro, logo essa palavra torna-se bastante relativa, melhor dizendo é decisão pública. A senhora concorda?

- Em absoluto. Deixe-me explicar uma coisa para essa conversa fique bem clara. Nos tempos Antigos entendia-se doação “como um contrato solene, a doação é difundida na cultura ocidental como o ato de alguém dar a outrem ou a uma instituição, geralmente necessitados, um bem próprio...”

- Alto, lá! Exclamei. Meus livros foram comprados; são meus e se quero doar a uma biblioteca pública, tenho esse direito, melhor, dever de cidadão. A senhora por acaso guarda nota fiscal de livros comprados? Por outro lado Biblioteca tem o sentido, entre outros, de: Coleção pública ou privada de livros e documentos congêneres, para estudo, leitura e consulta. Também edifício ou recinto onde ela se instala. Esse conceito Renascentista de doação não se aplica, na modernidade, a doações públicas. Se a senhora não sabe, na Renascença não havia poderes de governo. Experimente doar carne estragada às escolas públicas, (se é que eles recebem) a senhora será presa. Por que com livros seria diferente?

- O senhor está ficando exaltado, estou tentando explicar como funciona a prática de doação de livros.

- Não estou exaltado, apenas quero doar livros à biblioteca pública e não são livros estragados.

- Muito bem, deixe-me perguntar-lhe uma coisa. “Que significado adquirem na atualidade as sucessivas doações de livros feitas por pessoas supostamente de boa vontade que, por contingência do volume que se acumula em suas residências, por falta de espaço ou de serventia para os filhos, que cresceram, “entregam” às bibliotecas seu precioso bem? Por outro lado, que sentido pode ser atribuído ao gesto de recolher o que muitas vezes resulta de limpeza geral e se mistura àquilo que já não nos serve?”

- A senhora está sugerindo que eu estou usando de artifício para me livrar dos livros? Que estou doando livros que não servem à biblioteca?

- Digo mais, senhor! “São ações técnicas com o propósito de evitar “duplicação, contaminação por fungos e sujidade, inadequação, congestionamento de espaços e de serviços, bem como constrangimentos.

-A senhora falou constrangimento? Foi isso que ouvi?

- Sim, senhor! Constrangimento, e se não se importa, já que não marcou horário, eu preciso sair agora.

Melhor será procurar coletores de lixo. Meu único receio é que os livros constranjam o aterro sanitário.

4 comentários:

  1. Querido amigo, se vc tem livros para doar, me envie. pode ser até mesmo aqueles que vc quer se livrar. estamos aceitando sua doação. Contate Ana Maria (oxx86-99170234) ela é escritora e estar montando uma biblioteca pública. Pronto. Resolvido seu problema.Sério. A Ana precisa de livros. Mas, seu comentário nos remete ao momento que vivemos no Brasil. Enquanto um catador de lixo, monta uma biblioteca com o que encontra, outra não aceita doações por regras exdruxulas.Mesmo não sendo um caso verdadeiro, apenas um conto... Este é o país em que vivemos. Lúcia

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  2. Sempre quis montar uma biblioteca pública, mas tenho receio de que ninguém mais se importe em frequentar uma biblioteca... enquanto a coragem não vem, vou organizando meus livros em casa mesmo... Parabéns pelo artigo! Quando tiver um tempo, passe lá no meu blog: www.numbalaiodegato.blogspot.com

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  3. Pois é pessoal....diante deste conto ficamos até sem saber o que fazer.........eu tenho uma coleção, intacta, conservadíssima, Prêmio Nobel de Literatura, são 68 volumes. Desejo doar, penso que tantos podem fazer bom uso desta dádiva, que nos transpõe de uma maneira tão simples para mundos inimagináveis mas com um poder tão grande de transformação.

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  4. Gostaria de informar que aceito doação de livros, discos, cds, dvds, revistas em quadrinhos em qualquer cidade do Espírito Santo. Basta entrar em contato pelo meu mail (marcos.graminha@gmail.com) ou pelo telefone 27 9254-0070. Na grande Vitória posso retirar. Caso vc more fora da Grande Vitória ou do estado, tbm aceito doação. Aceito doação de eletronicos (radios, video games, jogos, vitrolas , etc) em qualquer estado de conservação. Entre em contato.

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